Instantes

É sábado de manhã. Acordaste tarde, 11 da manhã, recorde de todos os recordes. Comeste a papa toda como se não houvesse amanhã e depois foste comigo para a sala.
Sentei-te ao meu colo e inexplicavelmente ficaste encostado a mim a ver televisão, o teu canal preferido, ainda talvez entorpecido por um sono exagerado de fim-de-semana.
Tão sossegado, tão tranquilo, tão raro…
Um momento que gostava parar, congelar, fotografar a preto e branco, guardar no meu livro de memórias.
Sentir o teu peso sobre mim, o teu calor, o teu cheiro, o teu cabelo desgrenhado sobre a testa, a tua mãozinha sobre a minha, as tuas expressões enquanto vês imagens coloridas a dançarem para ti…
O que pensas não sei mas estás feliz, sorris quando te viras para cima e olhas para mim. Envolves a minha face com a tua mão e aninho-me em ti, ficamos assim abraçados até ouvires mais uma música que sai da caixa mágica a que sabes chamarmos televisão.
Brincas com os pés, puxas os collants até ficarem do dobro do tamanho, danças ao ritmo da música, bates palminhas satisfeito mas sempre ao meu colo…
Estranhamente, talvez porque não quero que termine, parece já uma eternidade o tempo em que estamos assim, só os dois, mãe e filho, como antes, unidos por algo indefinido a que tantos chamam amor, outros dependência, e que eu não consigo explicar nem catalogar, apenas sentir… Penteio com os dedos os teus caracóis acobreados, “inspiro-te” prolongadamente, dou-te um beijo, um beijo demorado e doce como a papa que te perfuma a face e, tal como nas histórias que te hei de vir contar, acordas do teu encantamento e saltas sem demoras para o chão como se aquele instante não tivesse sequer existido, como se tivesse sido apenas um sonho de mãe numa normal manhã de sábado…